Uma experiência de quase morte não é algo muito fácil de esquecer,
sobretudo quando se tem 16 anos. Nessa época, eu era um rapaz
latino-americano, franzino e com algumas espinhas na testa. É verdade,
era mais do que eu desejava, se é que alguém deseja ter espinhas. Eu era
o típico adolescente: cheio de sonhos, impulsivo e medroso. Mais
medroso que impulsivo, aliás.
Então, no verão de 1998, um tio – que era sócio de um clube na
cidade – teve a brilhante ideia de levar minha família à piscina do dito
cujo. Havia uma espécie de comemoração, e um amigo dele animava a festa
tocando um teclado. Foi um evento bacana. Eu, mesmo medroso – e sem
saber nadar – entrei na piscina e ensaiei algumas braçadas, perto da
borda esquerda (que eu não sou bobo, nem nada, não é mesmo?). Braçada
daqui, braçada de lá, resolvi fazer a travessia, chegando onde não era
possível apoiar os pés.
Já próximo ao fim do tanque, duas garotas conversavam apoiadas na
beirada e eu fiz o que nenhum ser racional o suficiente faria numa
situação de dificuldade. Eu tinha dado somente algumas toscas braçadas e
já me achava o César Cielo. Resolvi fazer graça com elas: “Se eu não
conseguir chegar lá, vocês me ajudem, hein?”. Elas riram. Devem ter
pensado: “Que idiota!”.
O fato é que eu me distraí o suficiente para me atrapalhar, como
se eu precisasse de muita coisa para isso. Dei mais duas braçadas e
estiquei a mão direita para alcançar a borda, mas meus dedos resvalaram
no azulejo, eu não estava perto o bastante. Foi aí que começou o meu
flagelo: tentei agarrar-me à borda mais algumas vezes, porém, eu
afundava rapidamente, mesmo lutando contra isso. O ar ficava
proporcionalmente mais escasso, à medida que o desespero aumentava. E
mesmo numa situação tão intensa eu consegui ser sagaz o suficiente para
ter uma ideia extraordinária: bastava que eu descesse até o fundo (que
distava apenas dois metros), desse um impulso, e enfim, segurasse a
borda. Meu plano era infalível!
Comecei a afundar, então. Era só dar um impulso e tudo certo.
Afundei mais um pouco. Como eu não tinha pensado nisso antes! Afundei
mais. Caramba, cadê o fundo que não chega nunca? Cristo, Senhor! Eu
estava morrendo e seria rápido. Comecei a soltar bolhões de ar, os
últimos que me restavam. Aquela história de ver a vida passar em sua
frente, veja querido leitor, se aconteceu, eu nem percebi. Eu só pensava
que estava morrendo, e me debatia. Na lápide estaria escrito: “Aqui jaz
um rapaz latino-americano, franzino e idiota o suficiente para cantar
duas garotas na parte mais funda da piscina sem saber nadar”.
Olhei para cima, e uma forte luz dominou meus olhos,
ofuscando-me, temporariamente. E no meio dessa luz eu vi uma mão, e eu
senti uma paz tão grande que eu nem me preocupei se ia morrer ou não.
Segurei a mão e meu corpo foi ficando cada vez mais leve, muito leve, e
subitamente fui arrancado para fora da água. A luz era o sol, e a mão
era da minha mãe, a única pessoa que percebeu que tinha alguma coisa
errada. Todo mundo estava pensando que era uma brincadeira minha, logo
eu, que não brinco com essas coisas.
Fiquei com a maior vergonha das garotas e uma dor de cabeça tão
forte como nunca senti em minha breve vida. Mas aprendi. Se você não
souber fazer, não faça. Se mesmo assim for fazer, não se distraia,
principalmente se isso puder lhe custar a vida. E por último e não menos
importante, se mamãe falar, dê-lhe atenção, porque mãe, meu amigo, vê
coisas que ninguém mais vê.
George dos Santos Pacheco
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