Crônica tupiniquim



A sociedade era estratificada e hierarquizada. A classe política, vivia de banquetes e muito luxo, isenta até mesmo de julgamento em tribunais comuns. A base da sociedade era formada pelos trabalhadores, camponeses e burguesia que, sustentava toda a sociedade com seu trabalho e com o pagamento de altos impostos, e os desempregados aumentavam em larga escala.

A vida dos trabalhadores e camponeses era de extrema miséria, sendo assim, desejavam melhorias na qualidade de vida e de trabalho. A burguesia, mesmo tendo uma condição social melhor, desejava uma participação política maior e mais liberdade econômica em seu trabalho.

Apoiado em tal frágil estrutura, o governo afundou com facilidade numa crise econômica e fiscal. E o povo estava cada vez mais irritado com a incompetência do governante e com a indiferença contínua e a decadência da aristocracia do país.

Vocês reconhecem o lugar de que fala esse texto? Terá sido retirado dos livros de história, em que somos a “memória dos dias que virão”? Não, esse lugar não é o Brasil, cara pálida. É a França do século 18, pouco antes do evento conhecido como Queda da Bastilha. Evidentemente, foi alterado em alguns pontos, omitindo o nome do país e qualquer referência desse tipo, para o efeito, digamos... didático deste ensaio.

Curioso, não é? Muito similar a nossos dias em terras tupiniquins, aliás, ao que vivemos desde muito tempo. Será um problema crônico, enraizado na estrutura de nossa nação? É possível. O fato é que esse recorte de nossa história contemporânea retrata uma das maiores crises de nossa história e tudo segue muito disfarçado, muito sutil, talvez por vivermos uma realidade de crédito (e endividamento) fácil, de redes sociais, TV... um grande embuste que desvia nossa atenção de nossos tão conhecidos problemas sociais. Mas a crise está aí, não se engane. Assistimos às notícias como se não fosse conosco, como se fosse em um lugar fictício (ou a França do séc. XVIII).

Ah, então você acha que não está tão ruim assim? Sabe qual é o termômetro disso tudo? A criminalidade, caro leitor. O número de assaltos a pedestres e roubos em estabelecimentos em Nova Friburgo aumentou assustadoramente e está sim, quer você queira ou não, vinculada à crise, essa que bate à sua porta.

Enquanto isso, trata-se o sinal de TV digital como uma necessidade básica do brasileiro. Reparou nisso? Estão anunciando com grande preocupação o fim do sinal analógico e  promovendo distribuição de conversores para quem é cadastrado em programas  sociais do governo. Ora, faça-me o favor! Então, a TV é  mesmo essa necessidade que estão aventando? Em 2 anos, milhões ficaram abaixo da linha da pobreza no Brasil e ganham menos de R$ 140, segundo o Banco Mundial. Na verdade, deveriam anunciar o fim do sinal analógico da Educação, Saúde e Segurança Pública, afinal, todos temos direito a serviços em alta definição. TV?

Pois bem, assistamos TV. Vamos nos distrair, nos alienar e ter esfregada na cara a bandalha na corte, as votações que livram o rei de investigações, o luxo e os banquetes! Pão e Circo. Aliás, caro leitor, repare como toda essa opressão existe há tempos, não é exclusividade brasileira. Tudo isso já aconteceu em diversos períodos, em diferentes lugares e tornamos a repetir os mesmos erros. Não é uma situação crônica (e aguda) tupiniquim, talvez seja do ser humano. Sei lá.

Deus que nos perdoe. Outrora, o Todo Poderoso se irritou com o ser humano (o que não é difícil, afinal nós mesmos nos irritamos conosco) de tal maneira e decidiu acabar com tudo para recomeçar, formatou e instalou um sistema operacional novinho, mas… não livre de vírus, infelizmente. E cada vez me convenço de que precisamos parar e fazer tudo de novo. Mas, fico aqui pensando: se precisamos de um recomeço, é melhor decidirmos e implementar por nós mesmos – e o mais rápido possível, porque vá que Ele se zangue dessa vez somente com o Brasil?


George dos Santos Pacheco
georgespacheco@outlook.com

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